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PortuguêsInterpretação de textos (2)


EXERCÍCIOS - Exercício 155

  • (INSTITUTO AOCP 2017)

SOLIDÃO INTERATIVA

Ronaldo Coelho Teixeira

A primeira vez que vi esse termo foi por meio de um jeca superjóia: Juraildes da Cruz. Tocantino de Aurora, radicado em Goiânia, Goiás e um dos maiores compositores contemporâneos brasileiros. Não seria pra menos! Afinal, foi ele quem criou o hit que Genésio Tocantins espalhou pelo Brasil por meio do Domingão do Faustão, na TV Globo, em 1999. “Nóis é jeca, mas é joia”, aquele da farinhada, feita da mandioca, da macaxeira ou do aipim, a depender da região brasileira. Sacada de mestre, de quem está sempre antenado ao mundo e aos seus. Juraíldes da Cruz em sua letra, visionária – como tudo o que os gênios, as antenas da raça fazem – já arrepiava: “Tiro o bicho de pé com canivete, mas já tô na internet”. E isso quando a www ainda engatinhava.

Mas com esse achado que agora evoco aqui, o artista quer mesmo é alertar para o mau uso das tecnologias, sobre coisas que o homem cria, mas que geralmente acaba escravo delas. Solidão interativa foi cunhado pelo sociólogo francês Dominique Wolton. Em sua tese, o autor alerta quanto ao cuidado para com o uso da internet, principalmente das redes sociais, chamando a atenção para um detalhe vital no avanço das tecnologias de comunicação: não importam formas e meios de expressão, a comunicação humana não foi, não é e nunca será algo tão simples, sempre vai conter grandeza e dificuldade. Wolton justifica-se dizendo que a internet é incrível para a comunicação entre pessoas e grupos que tenham os mesmos interesses, mas está longe de ser uma ferramenta de comunicação de coesão entre pessoas e grupos diferentes. E que por isso, a internet não é uma mídia, mas um sistema de comunicação comunitário. Ele prova isso afirmando que podemos passar horas, dias na internet e sermos incapazes de ter uma verdadeira relação humana com quer que seja.

A solidão interativa grassa nas redes sociais, especialmente no facebook. São fotos e fotos postadas – a maioria – forjando uma felicidade quando, na verdade, é tudo fake. As mais usuais são aquelas em que o autor se autofotografa – as famosas selfies – e sai espalhando-as de um dia para o outro, quando não, de uma hora para outra.

Tem as gastronômicas. Aquelas em que o autor antes de comer um prato ou uma iguaria especial, fotografa e já a lança na rede como a dizer que está podendo. Mas aquela comidinha do dia a dia, a da vida real, ele jamais vai postar. Ovo frito? Nem pensar! E aquelas dos momentos felizes? Sim, tem gente que acha que os seus instantes de lazer e diversão têm que, obrigatoriamente, ser vistos por todos. E lá vai um post ao lado do namorado ou namorada, dos amigos, geralmente com ares de forçação de barra. Porque a gaiola do tempo, forjada por nós mesmos, só pode ser aberta pela chave da felicidade plena.

E tem aquela que é emblemática: a mensagem em que o internauta revela o status do seu sentimento. Mas o ápice da solidão interativa está naquela figura que posta alguma coisa e ela mesma vai lá e a curte. De dar dó, não? Temos milhares de ‘amigos’ nessa cornucópia virtual. Nessa Caixa de Pandora do Século XXI, eis-nos diante de uma incoerente quimera: o autoengano. [...]

O autoengano é peça-chave para a nossa sobrevivência. Mentimos – a partir dos dois meses de idade – não só para os outros, mas, principalmente, para nós mesmos. Mesmo protegidos na redoma da interatividade, continuamos sós, ali, onde apenas a solidão nos alcança. Enquanto teclamos a torto e a direito, sugerindo que estamos sempre ON, a vida verdadeira continua OFF. E nunca nos damos conta de que, no fim, toda a solidão que nos rodeia, essa sim, é real. Porque bytes, bits e pixels não transmitem calor. E o verbo sem o hálito quente é apenas palavra morta.

Adaptado de:< http://lounge.obviousmag.org/espantalho_lirico/2016/08/solidao-interativa.html >.


Ronaldo Coelho Teixeira, no texto, discute


A) a definição de solidão interativa, com base em Juraíldes da Cruz e Dominique Wolton. Para isso, utiliza experiências pessoais, relatando estar sempre cercado de amigos virtuais, que compartilham os mesmos interesses, publicando apenas as partes positivas dos acontecimentos diários e escondendo a solidão real que enfrenta.

B) a utilização da internet em sociedades contemporâneas. Para isso, mostra a visão de outros autores, descrevendo características positivas e negativas desse uso, mostrando que as pessoas estão sempre cercadas de muitos amigos e costumam compartilhar momentos agradáveis e felizes. A partir disso, o autor postula a não existência de uma solidão real e interativa.

C) o uso da internet em sociedades modernas. Para isso, associa a sua visão à de outros autores, apontando características essencialmente positivas desse processo interativo. Assim, enfatiza o quanto a internet aproxima grupos com interesses diferentes e mostra o cotidiano real dos indivíduos que a usam.

D) o conceito de solidão interativa, cunhado por Dominique Wolton. Para o sociólogo francês, a expressão está relacionada a características psicológicas de indivíduos que trabalham com comunicação, os quais passam grande parte do tempo conectados, enfrentando, diariamente, uma solidão real.

E) a relação das pessoas com o uso da internet. Para isso, concilia sua visão à de outros autores, apontando características prioritariamente negativas desse processo interativo. Assim, ressalta o caráter ilusório da comunicação e da expressão virtual, mostrando que, por trás da grande quantidade de amigos e da aparente positividade dos acontecimentos diários, está oculta uma solidão real.


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