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PortuguêsNoções gerais de compreensão e interpretação de texto


EXERCÍCIOS - Exercício 419

  • (UPENET/IAUPE 2017)

Texto 1

SINTAXE PENOSA

Não, dileto leitor, não incorporei o espírito do professor Pasquale; não é o objetivo da presente coluna proferir uma invectiva contra os que violentam a sintaxe da língua de Camões com gerundismos ("vamos estar falando de ciência") ou destroçam a harmonia das orações subordinadas. Quando digo "sintaxe penosa", entenda-me literalmente: passarinhos cujo canto tem regras semelhantes à nossa tradicional ordem de sujeito seguido de verbo e objeto (por exemplo) nas frases.

Se essa possibilidade não faz cair o seu queixo, deveria. Como enfatizei na coluna passada (eu sei, faz duas semanas já, mas quem sabe você recorda), os cientistas têm mostrado que é cada vez menor a lista das faculdades mentais exclusivamente humanas. Uma das poucas que sobraram – ou melhor, sobravam – é a linguagem com sintaxe. Alguns passarinhos japoneses resolveram melar o nosso triunfo, ao que parece.

Os penosos em questão pertencem à espécie Parus minor , ou chapim-japonês. Assim como uma grande variedade de outros animais, incluindo outras aves, obviamente, mas também primatas como nós e outras criaturas, o chapim-japonês produz vocalizações que podem ser comparadas às nossas palavras.

Esses sons foram criativamente apelidados com as letras A, B, C e D. Seu significado varia um pouco, mas podemos dizer, de modo geral, que combinações das três primeiras "palavras" (AC ou BC, por exemplo) denotam a presença de diversos tipos de predadores, enquanto os sons do tipo D (caracterizados por uma sequência de sete a dez "notas", como as de uma música) servem para recrutar outros passarinhos – quando um macho chama sua parceira, por exemplo.

O bacana, porém, é que a "palavra" D pode ser combinada às outras, modificando o sentido delas. AC-D, digamos, pode ser usado quando um chapim vê um falcão e chama outras aves para avisá-las sobre o caçador e convocá-las para fazer " mobbing " (quando vários passarinhos se juntam para intimidar uma ave de rapina).

A pergunta é: será que faz diferença a ordem dos fatores? Afinal, em português, "O cão mordeu o menino" e "O menino mordeu o cão" são frases com sentido completamente distinto. Foi o que Toshitaka Suzuki, da Universidade Sokendai, no Japão, resolveu testar usando gravações das "palavras" típicas das aves.

Resultado: quando ouvem as gravações de ABC, os chapins olham assustados para os lados esperando um predador; se escutam só D, voam na direção do alto-falante, procurando o colega que teria chamado por eles. ABCD produz, como esperado, um misto de olhares assustados para os lados e voo rumo ao som. E quando o som é DABC? Em geral, nada – os bichos ficam confusos. A sintaxe da "frase" não faz sentido para eles. Ou seja, é a ordem dos termos dos chamados que importa nesse caso, como na fala humana. Os dados estão em artigo na revista científica " Nature Communications ".

Pode ser que você não esteja lá muito embasbacado com as proezas sintáticas do chapim-japonês. Está no seu direito, obviamente, mas o que descobertas como essa reiteram, feito a linha de baixo constante e sólida de um bom rock, é o fato inconteste de que as nossas capacidades mentais aparentemente inigualáveis derivam, na verdade, de "tijolinhos" cognitivos que já estavam presentes nos lugares mais improváveis da Árvore da Vida. Nosso edifício comportamental é mais arrojado, faraônico até – mas ainda tem as marcas de que um dia foi uma choupana.

LOPES, Reinaldo José. Publicado em 27 mar. 2017. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/reinaldojoselopes/2016/03/1754157-sintaxe-penosa.shtml. Acesso em: 8 jul. 2017. Adaptado.


Para compreender globalmente o Texto 1, o leitor deve considerar que o autor tem como propósito principal


A) criar humor, a julgar pela linguagem descontraída como inicia seu texto: “Não, dileto leitor, não incorporei o espírito do professor Pasquale”.

B) defender a ideia de que a organização sintática da linguagem humana é o que distingue o homem das outras espécies (2º e 8º parágrafos).

C) dialogar prioritariamente com a comunidade científica, o que fica evidente com o emprego do termo científico “ Parus minor ” (3º parágrafo).

D) instruir o leitor acerca de metodologia científica, apresentando-lhe o passo a passo do trabalho, sobretudo nos parágrafos 4º, 5º e 7º.

E) divulgar trabalho científico a público não especializado, como se observa na linguagem simples como a pesquisa é exposta nos 4º e 7º parágrafos.


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