Procura

PortuguêsNoções gerais de compreensão e interpretação de texto


EXERCÍCIOS - Exercício 340

  • (FCC 2018)

A retórica de que se trata aqui é essa metalinguagem (cuja linguagem-objeto foi o “discurso”) que reinou no Ocidente do século V a.C. até o século XIX d.C. Esse discurso sobre o discurso comportou várias práticas, presentes, simultânea ou sucessivamente, segundo as épocas, na “Retórica”, entre elas:

1. uma técnica, isto é, uma “arte”, no sentido clássico da palavra – arte da persuasão, conjunto de preceitos cuja aplicação permite convencer o ouvinte do discurso (e mais tarde, o leitor da obra), mesmo quando aquilo de que se deve persuadi-lo seja “falso”;

2. um ensinamento – de início transmitida por vias pessoais, inseriu-se rapidamente em instituições de ensino;

3. uma ciência, ou, em todo caso, uma protociência − um campo de observação autônomo delimitando certos fenômenos, a saber, os “efeitos” de linguagem;

4. uma moral – sendo um sistema de “regras”, a retórica está penetrada da ambiguidade da palavra: é ao mesmo tempo um manual de receitas, animadas por uma finalidade prática, e um Código, um corpo de prescrições morais, cuja função é vigiar (isto é, permitir e limitar) os “desvios” da linguagem passional;

5. uma prática social – a Retórica é essa técnica privilegiada (pois que é preciso pagar para adquiri-la) que permite à classe dirigente garantir para si a propriedade da palavra. Sendo a linguagem um poder, decidiu-se das regras seletivas de acesso a esse poder, constituindo-o em pseudociência, fechada para “aqueles que não sabem falar”, tributária de uma iniciação dispendiosa (nascida há 2500 anos de processo de propriedade, a retórica se esgota e morre na classe de “retórica”, consagração iniciática da cultura burguesa).

A Retórica (como metalinguagem) nasceu do processo de propriedade. Por volta de 485 a. C., dois tiranos sicilianos, Géron e Hiéron, operaram deportações, transferências de população e expropriações, para povoar Siracusa e distribuir lotes aos mercenários; quando foram derrubados por um levante democrático e se quis voltar ao ante qua, houve inumeráveis processos, pois os direitos de propriedade estavam obscurecidos. Esses processos eram de um tipo novo e mobilizavam grandes júris populares, diante dos quais, para convencer, era preciso ser “eloquente”.

Essa eloquência, participando ao mesmo tempo da democracia e da demagogia, do judicial e do político (o que se chamou depois de deliberativo), constituiu-se rapidamente em objeto de ensino. Os primeiros professores dessa nova disciplina foram Empédocles de Agrigento, Córax, aluno seu de Siracusa (o primeiro a cobrar pelas aulas), e Tísias. Esse ensino passou com igual rapidez para a Ática (depois das guerras médicas), graças às contestações dos comerciantes, que moviam processos conjuntamente em Siracusa e em Atenas: a retórica já é, em parte, ateniense desde meados do século V.

Córax coloca já as cinco grandes partes da oratio, que formarão durante séculos o “plano” do discurso oratório: 1. exórdio; 2. narração (relação dos fatos); 3. argumentação ou prova; 4. digressão; 5. epílogo. É fácil verificar que, ao passar do discurso judicial para a dissertação escolar, esse plano conservou a sua organização principal: uma introdução, um corpo demonstrativo, uma conclusão .

(Adaptado de: BARTHES, Roland. “A Antiga Retórica”, A Aventura Semiológica , Lisboa, Edições 70, 1987)


Em consonância com o texto e com os fundamentos da retórica, pode-se afirmar:


A) Da Antiguidade, com Demóstenes ou Cícero, até chegar às redações escolares, é preciso acrescentar também outra modalidade de discursos retóricos, os sermões eclesiásticos, embora neles a persuasão e a credibilidade não tivessem importância, visto que a fé constituia um dado inexorável.

B) O convencimento era preocupação secundária para a retórica, uma vez que os tribunais de júri na Antiguidade importavam-se sobretudo com a eloquência dos discursos.

C) A retórica, que se origina nas disputas por poder político, tem início em Atenas, a partir de um desmembramento da filosofia, já que esta se dedicava ao pensamento abstrato, enquanto a arte da eloquência tinha por base a utilidade.

D) A verdade por si só, a que se dedicava a filosofia, não era necessariamente persuasiva; este atributo cabia de modo mais apropriado à arte retórica, cujos discursos procuravam obter eficácia através da verossimilhança.

E) O texto, esclarecendo um caminho de decadência da retórica até os dias de hoje, culmina com um paralelo com a estrutura da dissertação escolar, que mantém a mesma organização, embora sem utilidade prática.


Próximo:
EXERCÍCIOS - Exercício 341

Vamos para o Anterior: Exercício 339

Tente Este: Exercício 342

Primeiro: Exercício 1

VOLTAR ao índice: Português






Cadastre-se e ganhe o primeiro capítulo do livro.
+
((ts_substr_ig=0.00ms))((ts_substr_id=4.09ms))((ts_substr_m2=0.00ms))((ts_substr_p2=0.61ms))((ts_substr_c=2.75ms))((ts_substr_im=0.96ms))
((total= 8ms))